Realização, Produção, Fotografia, Montagem e Som – Manoel Oliveira
Argumento segundo o Auto de Paixão de Francisco Vaz de Guimarães
Conselheiros técnicos – Padre José Carvalhais e José Régio
Assistentes de Realização – António Reis, António Soares e Domingos Carneiro
Colaboração de Paulo Rocha (sequência do Jornal de Actualidades)
Guarda-roupa – Jayme Valverde
Apetrechos - Amândio Medeiros
Caracterização - Max Factor – Adélia Chaves
Director de som - Manoel de Oliveira
Operador de som (referência) - Maria Isabel de Oliveira e Rosalio Almada.
Assistente de som - João Barbosa
Montagem da versão francesa - António Lopes Ribeiro
Laboratório de Imagem - Tóbis Portuguesa e Ulyssea Filme
Laboratório de som - Studios Marignan (Paris)
Intérpretes – Nicolau Nunes da Silva (Cristo), Ermelinda Pires (Nossa Senhora), Maria Madalena (Madalena), Amélia Chaves (Verónica), Luís de Sousa (Acusador), Francisco Luís (Pilatos), Renato Palhares (Caifás), Germano Carneiro (Judas), José Fonseca (Espião), Justiniano Alves (Herodes), João Miranda (S. Pedro), João Luís (S. João), Manuel Criado (Diabo), Manoel Oliveira (Narrador) e o povo de Curalha-Chaves.
Festivais - Prémio Casa da Imprensa para Melhor Realização; Medalha de Ouro em Siena (1964); Menção Especial Interfilm do Júri Internacional das Igrejas Protestantes (Berlim, 1981)
Em Acto da Primavera, Oliveira confirma o olhar contemporâneo sobre o mundo rural, sem o paternalismo e os preconceitos ideológicos do passado. Objecto cinematográfico singular, que inaugura uma corrente de hibridação entre a ficção e o documentário, Acto da Primavera filma a representação do Auto da Paixão, na Curalha, uma aldeia de Trás-os-Montes, com base num texto do século XVI da autoria de Francisco Vaz de Guimarães. Terá sido na pesquisa levada a cabo para o documentário sobre o pão que Manoel de Oliveira descobriu a aldeia onde veio a filmar a sua segunda longa-metragem. “Numa manhã chuvosa de Março de 1958, era Semana Santa, percorria eu Trás-os-Montes à procura de moinhos que satisfizessem o que tinha imaginado para o meu filme O Pão. Deparei com três grandes cruzes de madeira tosca erguidas à beira da estrada. Surpreendido, perguntei para que eram e logo me informaram que se destinavam à representação popular da Paixão de Cristo. Voltei para ver. O espectáculo era surpreendente pela ingenuidade e espontaneidade da representação, pela cor, pelo movimento e pelo salmodeado de recitação e dos cânticos. Desde essa altura pensei em fixar em imagens aquele insólito espectáculo.” (Manoel de Oliveira) Manoel de Oliveira e a sua equipa filmaram o espectáculo ao ar livre, no campo, e aquilo que inicialmente aparenta ser um documentário sobre um particular universo rural, transforma-se lentamente, ao longo do filme, numa ficção da vida de Cristo, em que os habitantes da aldeia assumem o papel, não apenas de figurantes da encenação que todos ao anos erguiam na Páscoa, mas de actores da história contada no filme. E Oliveira utiliza, mais uma vez, uma dualidade entre dois mundos opostos, contrapondo à ruralidade central do filme, que é expressa nos planos iniciais do quotidiano da população, a emergência do mundo moderno, dada desde logo pela leitura, em voz alta no centro da aldeia, da notícia da preparação da viagem do homem à Lua ou na presença do aparato cinematográfico – câmara, gravadores de som e técnicos - que Oliveira faz questão de filmar. “Eu queria mostrar que se estava a representar um acontecimento passado há dois mil anos, reescrito no século XVI, refeito no século XX, com magnetofones, máquinas, etc., de maneira que fiz questão de filmar as próprias máquinas que filmavam, o próprio gravador que gravava. Portanto, temos o tempo de Cristo, o século XVI e o século XX. Tudo dado ao mesmo tempo, tudo visto simultaneamente. Só o cinema pode dar este artifício. É por isso que o cinema é realmente sedutor.” (Manoel de Oliveira) O mesmo acontece com a chegada de espectadores urbanos para assistir ao Auto, cruzando-se num moderno Chevrolet Impala com os figurantes a cavalo que representavam soldados romanos. A presença da contemporaneidade volta no final do filme na sequência de imagens de guerra, editada por Paulo Rocha, na altura colaborador do cineasta, representando simultaneamente o Apocalipse, o clima de Guerra Fria e a ameaça nuclear que pairava sobre o mundo bipolarizado do pós-guerra mas, inevitavelmente, também a Guerra Colonial. “Os soldados desembarcam sobre o écran, identificamo-los facilmente com os americanos. Mas como pode o espectador de 1963 não pensar nas suas próprias guerras coloniais?” (Jacques Parsi)