As Pedras e o Tempoé um filme documental sobre a cidade de Évora que fala da luz do sul e do seu sol inclemente, dos espaços da cidade alentejana, da quietude dos seus claustros e telhados, começando e acabando com planos filmados em paisagens rurais. Os planos iniciais mostram uma agricultura mais manual, baseada na cortiça; já os planos finais mostram uma agricultura industrializada, com imagens de ceifeiras debulhadoras e uma referência a “cidades efémeras que surgem na planície”, referindo-se aos aglomerados de cereal que se acumulavam, deixando no ar uma ideia de progresso. Mas em As Pedras e o Tempo, Fernando Lopes mostra principalmente a arquitectura de Évora, a partir de vistas gerais afastadas da cidade, nalguns enquadramentos aéreos ou panorâmicas filmadas da periferia, mas também através de planos dos principais lugares e edifícios do centro: a Praça do Giraldo, a Universidade, a Sé, o Templo de Diana, a Igreja da Graça, a Capela dos Ossos ou o Museu. “Quis fazer sentir a presença do tempo em Évora, estabelecendo um contraste entre o silêncio das pedras e o ruído da vida, entre o vazio das praças e a gente que passa, entre o preto e o branco, tudo isto salientando os extraordinários valores plásticos da capital alentejana.” (Fernando Lopes)
Utilizando os diversos recursos técnicos do cinema - os travellings pelas arcadas da Praça do Giraldo ou nos claustros da Universidade são particularmente impressionantes - Fernando Lopes retrata, de forma radicalmente oposta ao que então se fazia no cinema português, um lugar e as pessoas que o habitam. “O tom com que mostrava igrejas e túmulos, ruas e monumentos, a terra e o céu, cortava cerce com a useira retórica nacionalista, interrogando os vestígios do passado (a memória?) na sua quietude, recusando a imposição de um sentido definido às interpelações várias que a cidade lhe oferecia. Neste filme começa todo um novo rumo para o cinema em Portugal." (Jorge Leitão Ramos) Este filme é essencialmente um ensaio na linguagem cinematográfica, em que Fernando Lopes aplica o que recolheu da sua passagem por Londres e Paris, um trabalho experimental de imagem, sonoplastia e montagem, onde se misturam sons do cante alentejano com ruídos tecnológicos e se provoca um desfasamento entre a banda sonora e as imagens, características que o realizador utilizará também mais tarde nos seus filmes de fundo. “Não deixei de aplicar em Belarmino certos princípios de As Pedras e o Tempo, porque trabalhei uma figura humana como se trabalha uma cidade. E sem As Pedras e o Tempo não tinha feito Uma Abelha na Chuva. Não só é uma obra matricial como é um filme muito recorrente em mim, porque tem a ver com um olhar sobre o real que vê nele o fantástico.” (Fernando Lopes)