Produção - François Truffaut e António da Cunha Telles
Assist. Realização - Jean-Pierre Léaud e Jean-André Fieschi
Dir. Fotografia - Raoul Coutard
Montagem - Claudine Bouché
Argumento - François Truffaut, Jean-Louis Richard e Jean-François Adam
Música - Georges Delerue
La Peau Douce foi rodado entre Outubro e Dezembro de 1963, na mesma altura em que se estreou Os Verdes Anos, e em Portugal foi tanto um fracasso de bilheteira como um insucesso crítico, tendo o próprio Paulo Rocha dito, à época, que o filme foi para ele uma grande tristeza e que Truffaut se “espalhou completamente”. O filme foi feito entre Jules et Jim, de que Truffaut emergiu com se de um “fracasso humilhante se tratasse” e Fahrenheit 451, para o qual não conseguia financiamento. Foi, assim, um filme de transição, escrito, filmado e distribuído rapidamente de forma a gerar receitas de que Truffaut necessitava. Mas passados cinquenta anos de relativa obscuridade, e depois de uma reedição numa nova cópia de 35 mm, La Peau Douce tem sido recuperado como uma das obras primas de Truffaut e da Nouvelle Vague. A história do filme conta-se rapidamente: um homem de família, Pierre Lachenay, cuja profissão de editor de uma revista literária requer que esteja sempre em movimento, voa para Lisboa onde dará uma conferência sobre Balzac e durante a viagem conhece Nicole, uma hospedeira de bordo que se torna sua amante, personagem interpretada por Françoise Dorléac, irmã de Catherine Deneuve. A mulher de Pierre descobre a traição do marido, e este sai de casa para viver com Nicole, que, no entanto, não partilha da sua intenção. Humilhado e sozinho, Pierre tenta voltar atrás, mas é assassinado pela mulher traída, no café que habitualmente frequenta.
Durante todo o filme, estes amantes de Truffaut são constantemente sujeitos à pressão dos acontecimentos e dos espaços à sua volta, confrontando-se com obstáculos inesperados e caminhos impostos, que, no limite, condenam Pierre ao seu fatídico destino. A cidade é hostil ao seu relacionamento, empurrando-os para fora dela, e isso torna-se evidente no acidente no metro que atrasa a sua partida para Lisboa; na indecisão sobre o local onde poderão dormir juntos em Paris, não querendo ser descobertos pelo senhorio de Nicole mas sentindo desconforto na vulgaridade de alugar um quarto de hotel; ou na série de peripécias que impedem o seu encontro na cidade de província onde Pierre dará mais uma conferência. Ou, ainda, na cena em que os amantes se encontram pela última vez, num apartamento ainda em construção que Pierre pensa comprar para começar a sua nova vida com Nicole, mas onde abruptamente descobre que não é essa a sua vontade. O apartamento não tem ainda paredes exteriores, o que se pode ler como um espaço com ambições de futuro – ainda podia ser tudo – mas também como a imagem de uma ruína, a dele e a da sua família. É também um espaço limite, suspenso sobre a cidade, acima do seu movimento contínuo, pela primeira vez longe do vai e vem que manteve o romance possível. A cena termina com Pierre, impotente, ainda no topo do edifício, a observar Nicole a retomar o seu lugar no movimento das ruas de Paris.