Em 1973, Álvaro Siza desenha para a Cooperativa Domus um supermercado, readaptando um edifício já existente e usando sem preconceitos o carácter publicitário associado ao seu programa. Se, por um lado, essa atitude demonstra a importância que a publicidade adquiriu nos anos sessenta e setenta em Portugal - com o advento de uma sociedade em que o consumo foi ganhando cada vez mais peso, como veremos em O Cerco -, por outro, revela a abertura da arquitectura portuguesa aos movimentos internacionais que os sucessivos contactos no estrangeiro foram permitindo. O que Jorge Figueira diagnosticou nas passagens do diário de Távora na sua viagem à América - “a dor de quem vê o Novo Mundo a aproximar-se, pulverizando a síntese tão custosamente conquistada entre tradição e modernidade” - é posto sintomática e ironicamente em evidência no edifício que Siza projecta no Bairro da Pasteleira, adaptando uma pré-existência sem história a um programa comercial. Nesta obra, Siza assume sem hesitações a influência de Robert Venturi e Denise Scott Brown, não apenas do ponto de vista arquitectónico - as referências e semelhanças com a Lieb House (1969) são claras – mas principalmente do ponto de vista teórico, reconhecendo a relevância dos livros desta dupla de arquitectos americanos. Antes de mais, Complexidade e Contradição na Arquitectura (1966), o livro a que Siza se referia quando, regressado de um congresso em Espanha, disse que “andava tudo doido com o americano”, e mais tarde, Learning from Las Vegas (1972), editado enquanto Siza projectava o edifício na Pasteleira. “Já tinha tido contacto regular com Espanha através dos Pequenos Congressos de Arquitectura, onde foi pela primeira vez o Portas, que na altura se movia muito pela América do Sul, Europa, etc. O Portas apresentou diapositivos de obras minhas e a partir daí convidaram-me para ir. Lembro-me que num desses Pequenos Congressos, em Barcelona, aparece alguém, que tinha ido aos Estados Unidos, com o livro do Venturi, Complexity and Contradiction. Naquela altura li esse livro; impressionou-me muito, tocou-me muito, interessou-me muito.”
Luis Urbano in Entre Dois Mundos. Arquitectura e Cinema em Portugal, 1959-1974